segunda-feira, 26 de setembro de 2011

Carta Aberta para nossos Senhores/Amos Corporativos

Janeiro 25, 2010

Nota do Blog: Esta é uma tradução livre da carta original publicada no Blog do Warren. O contexto é americano, mas se olharmos o Brasil veremos como o sistema corporativo feudal é o mesmo. Basta ver o lucro obsceno dos bancos, instituições oficiais de agiotagem; ou a capacidade das corporações e dos coronéis do agronegócio de destruir nossas ricas matas e ainda mudar o Código Florestal, mesmo com zero apoio popular; ou dos usineiros das capitanias hereditárias, que achincalham a lealdade do brasileiro com o etanol e, não contentes, metem 20 trancas na porta que permitiria a entrada do carro elétrico no Brasil; ou das montadoras corporativistas de "carroças nacionais," que a despeito de cobrarem 3 vezes o que os veículos valem, ainda fazem lobby para impedir a entrada de carros asiaticos (os quais os forçaria a baixar os preços e aumentar a qualidade). O texto abaixo tem tudo a ver com a enferma tecno-civilização global e com o moderno feudalismo - reinventado e ardilmente disfarçado de democracia pela corrompida ideologia do egoísmo borbulhante e da competição cega.



Prezados  Senhores,

Por favor, desculpe minha presunção, em escrever diretamente para aos Senhores. Eu nem sei o tratamento correto para me dirigir aos Senhores, e temo que "Prezados Senhores" não expresse suficientemente o reconhecimento  das vastas diferenças entre nossa condição. A Suprema Corte do meu país (USA) conferiu recentemente a Vossas Senhorias os poderes que Vossas Senhorias tem procurado por muitos anos, e felicito Vossas Senhorias por esta vitória no Poder Judiciário. Espero que em breve seja seguida por vitórias em outros poderes também.
Deixe-me ser franco. Tenho muito medo de Vossas Senhorias. É apenas a minha relativa insignificância em relação aos grandes planos de Vossas Senhorias que me dá coragem de falar, pois eu tenho certeza que se de alguma forma eu produzisse qualquer inconveniência real a Vossas Senhorias, eu seria esmagado. Mesmo mencionar a possibilidade de que eu pudesse gerar qualquer inconveniência a Vossas Senhorias é uma presunção, eu sei, dada a nossa abissal diferença de poder e influência. Eu posso falar da minha Dignidade e de meus Direitos, mas sei que a única razão porque tenho Dignidade e Direitos é porque Vossas Senhorias permitem. Perdoem-me. Não quero ofender Vossas Senhorias, já que Vossas Senhorias tem em suas mãos (metaforicamente falando, claro, uma vez que Vossas Senhorias não tem mãos) o futuro de tudo que me é caro.
 
Prezo minha família, minha esposa, minha linda e precoce filha de cinco anos. Prezo o meu trabalho, sou professor de música, e que ocupação mais agradável poderia haver do que partilhar da música que amo com meus semelhantes? Prezo as belas florestas perto de minha casa, porque caminhar por entre as árvores altas acalma meu coração e diminui a intensidade de meus pensamentos. Prezo as memórias dos meus professores e suas influências, e daqueles que foram companheiros de viagem nesta vida. Prezo os incontáveis elos na corrente ​​humana - até onde nós, macacos inteligentes, chegamos em apenas algumas curtas dezenas de milhares de  anos!

Acima de tudo prezo a Teia da Vida, da qual sou parte. Quando contemplo minha Morte,  estou confortado ao saber que meu corpo é feito de Matérias da Terra e Matérias do Sol, e que acabará eventualmente servindo como alimento para outras Vidas.

O que me assusta em Vossas Senhorias, caros Amos, é que Vossas Senhorias não podem contemplar vossa Morte, porque Vossas Senhorias são imortais. E, porque Vossas Senhorias não são feitos do mesmo material que Nós, Vossas Senhorias não tem vínculos de simpatia com Nós.

Então eu não posso apelar para as melhores naturezas de Vossas Senhorias, já que para os padrões da vida Terrena, Vossas Senhorias não tem nenhuma boa natureza. Eu só posso apelar para as naturezas predatórias de Vossas Senhorias; estas, Vossas Senhorias tem em abundância.

Nos últimos dois séculos Vossas Senhorias construiram sistemas econômicos que dependem de Nossa disposição de transformar-nos em lixo; sistemas articulados sobre a exigência de que Nós continuemos a consumir a taxas cada vez maiores.  Não consumir é falhar com nosso dever para com Vossas Senhorias, nossos Amos e Mestres.
Porém, caros Amos, começamos recentemente a perceber que o poder do sistema econômico de Vossas Senhorias está matando o planeta em que vivemos. Inúmeras espécies estão morrendo todos os dias; nos anos e décadas vindouros milhões desaparecerão da Terra a uma taxa mais acelerada do que em qualquer momento da história de nosso planeta (exceto, é claro, no dia quando o Grande Meteoro bateu).  Temos consumido avidamente a Matéria Solar armazenada em nosso planeta (petróleo), como Vossas Senhorias Nos ordenaram... mas recentemente Nós descobrimos que queimar a Matéria Solar está aquecendo a nossa atmosfera.

Se isso continuar, Caros Amos, há uma grande probabilidade de que todos Nós vamos morrer. Não "morrer", como em "seres humanos morrem todos os dias", ou "seu cachorro morreu na semana passada", mas "morrer" como em "a Terra não será mais capaz definitivamente de suportar qualquer forma de vida, porque ela vai estar muito quente."

E, em seguida, Caros Amos, o que Vossas Senhorias fariam?


Faltando a substância física, não sendo feitos de Matérias Terrestres e Solares como nós somos, Vossas Senhorias não poderão ficar de pé sobre a superfície de um planeta cozido, perguntando para onde todos se foram. Vossas Senhorias podem ser imortais, mas mesmo imortais têm que comer, e nós alimentamos Vossas Senhorias. Embora Vossas Senhorias não sejam feitos do mesmo material que Nós, se Nós morrermos, assim também Vossas Senhorias obrigatoriamente morrerão, e as mortes de Vossas Senhorias serão solitárias.

Suponho que Vossas Senhorias não queiram isso.

E assim, Caros Amos, eu timidamente defendo minha causa.


Ajustem vossos Sistemas Econômicos somente um pouquinho, de modo que Vossas Senhorias possam maximizar vossos lucros a partir de Nós no longo prazo ao invés de realizar ganhos obcenos e destrutivos no curto prazo. Eu vou pagar a Vossas Senhorias o que ganhar e comprar o que me disserem para comprar; em mais uma década vou mostrar a minha pequena menina como obter o seu próprio cartão de crédito para que Ela possa também entrar no serviço de Vossas Senhorias. Eu não me importo de continuar a ser trabalhador escravo de Vossa Senhoria; eu não me importo se a minha filha e seus filhos e os filhos de seus filhos até a centésima geração permanecerem na servidão de Vossas Senhorias.

Mas Vossas Senhorias precisam mudar as coisas apenas um pouco, para que essas crianças possam viver. Caso contrário, ninguém vai ter a chance, porque a Terra estará morta e mortos estarão Vossas Senhorias também.

Caras Corporações, Vocês sozinhas tem o poder de redirecionar recursos suficientes neste mundo para corrigir os problemas que Vocês próprias causaram. Vocês são nossos Amos, Senhores Feudais da Modernidade. Está no seu interesse manter a Terra um lugar bom para se viver, para que Vocês possam continuar a Nos consumir por milhares de anos.

Se Vossas Senhorias fizerem isso, se Vossas Senhorias fizerem essas mudanças, então eu posso morrer satisfeito, sabendo que os elos da nossa Corrente Humana não vão acabar como escória na face de uma paisagem venusiana. E, talvez, minha cem vezes-grande tataraneta e seus contemporâneos Humanos possam encontrar uma maneira de superar o Dominio de Vossas Senhorias, e viver livremente e pacificamente, sem desperdícios, dissipação ou guerra, em uma boa Terra, verde e azul, repleta de vida abundante. Isso é tudo que eu quero: apenas saber que as crianças terão uma chance, daqui a alguns séculos.

Agradeço a Vossas Senhorias por ouvir, se Vossas Senhorias estiverem ouvindo.

Vosso súdito mais humilde e abjeto,

WarrenS

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